O abono de permanência e a regra de aposentadoria do art. 3º da Emenda
Constitucional nº 47/2005
O abono de permanência somente pode ser concedido nos casos
expressamente previstos no texto constitucional, não podendo o gestor público,
sob o pretexto de respeitar a isonomia, concedê-lo por conta própria.
Resumo: O presente artigo estuda a viabilidade jurídica de se conceder
abono de permanência aos servidores públicos que se enquadram na regra de
aposentadoria do art. 3º da Emenda Constitucional nº 47/2005 e optam por
continuar na ativa. Analisa-se primeiramente o instituto do abono de
permanência, tecendo um breve histórico sobre sua inserção no ordenamento
pátrio. Faz-se, então, um estudo sobre os seus objetivos e um comparativo com a
isenção da contribuição previdenciária criada pela EC 20/1998.
Nesse diapasão,
são destacadas as previsões constantes na EC 41/2003 acerca do abono de
permanência, assim como as regras de aposentadoria que explicitamente ensejam a
sua concessão. Por conseguinte, destaca-se a regra de aposentação constante no
art. 3º da EC 47/2005 e a ausência de previsão legal acerca do deferimento do
abono aos que preenchendo os seus requisitos optam continuar trabalhando.
Por
fim, destaca-se o posicionamento dos que defendem a concessão do abono em
apreço, assim como os fundamentos que baseiam entendimento contrário, concluindo
pela necessidade de previsão legal a esse respeito, em prestígio ao princípio da
legalidade, suscitando o Projeto de Emenda Constitucional nº 418/2009.
Muitos dos servidores que preenchem os requisitos para aposentadoria
voluntária ainda estão em condições de continuar exercendo suas atividades.
Esses servidores encontram-se no auge de suas carreiras, tendo adquirido
conhecimento e experiência que os tornam essenciais para os órgãos públicos que
integram.
Sendo assim, o servidor público federal, estadual, distrital e municipal
tem a opção de continuar em plena atividade, embora já cumpra os requisitos para
aposentar-se, recebendo como contraprestação o denominado abono de permanência.
Ocorre que esse instituto acabou não contemplando de forma expressa todas
as regras de aposentadoria vigentes no arcabouço legal, exemplo disso é a
hipótese do art. 3º da EC 47/2005, que não traz previsão quanto ao abono,
gerando uma situação anti-isonômica e de incerteza jurídica. Necessário,
portanto, o estudo acerca do tema.
- O abono de permanência consiste em parcela remuneratória[1] paga ao
servidor público exercente de cargo efetivo que tendo implementado os requisitos
para sua aposentadoria voluntária, opta por permanecer em atividade.
- Conforme previsão do §19, do art. 40 da Constituição Federal de 1988, o
abono corresponderá ao valor da contribuição previdenciária do servidor e, uma
vez concedido, deverá ser pago até que o mesmo complete 70 anos de idade, quando
se dará sua aposentadoria compulsória, ou, antes disso, quando resolver migrar
de forma espontânea para a inatividade.
- Gustavo Terra Elias (2009, p. 78) complementa o conceito apresentado,
afirmando que:
“O
abono de permanência [...] constitui-se em indenização pecuniária equivalente ao
valor da contribuição previdenciária descontada da remuneração do servidor
titular de cargo público efetivo, que lhe é devido mensalmente para compensar o
esforço de permanecer em atividade após ter preenchido as condições para
aposentar-se voluntariamente”.
O instituto em questão estimula o servidor a continuar exercendo as suas
funções em prol do serviço público e, de forma indireta, gera economia para o
Estado, na medida em que retarda a concessão de aposentadorias e a contratação
de novos agentes, atividades que oneram os cofres públicos. Assim, poder-se-ia
dizer que o abono de permanência, além do seu objetivo imediato de beneficiar o
servidor através de um ganho remuneratório, possui clara intenção de gerar
economia e eficiência para o Poder Público.
Perpassada essa questão, cumpre esclarecer que o abono de permanência não
é instrumento legal de toda forma inédito no ordenamento pátrio, vez que
instituto com natureza semelhante surgira em meados de 1821, por meio de Decreto
do Príncipe Regente Dom Pedro de Alcântara. Já neste período, os servidores
públicos que preenchessem as regras vigentes para aposentadoria voluntária e
escolhessem permanecer trabalhando, fariam jus a uma espécie de vantagem
pecuniária.
Nesse sentido, Bruno Sá Freire Martins (online, 2012) assevera que:
“Historicamente o abono surgiu por um Decreto do príncipe regente Dom Pedro de
Alcântara, baixado em 01 de Outubro de 1821, onde se previu que aqueles que,
tendo completado o tempo, não quisessem se aposentar permaneceriam em atividade
e teriam um abono adicional de ¼ do salário – prenúncio do que, mais tarde,
viria a ser o abono de permanência em serviço, benefício pago pela Previdência
moderna até 1991, equivalente a 25% do salário-de-benefício.”
A Emenda Constitucional nº 41/2003 é a verdadeira responsável pelo
ingresso do abono de permanência na nova ordem constitucional, inserindo o §19
no art. 40 da Carta Magna de 1988, com o seguinte teor:
“Art.
40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é
assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante
contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos
pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e
atuarial e o disposto neste artigo.
[...]
§ 19. O servidor de que trata este artigo que tenha completado as
exigências para aposentadoria voluntária estabelecidas no § 1º, III, a, e que
opte por permanecer em atividade fará jus a um abono de permanência equivalente
ao valor da sua contribuição previdenciária até completar as exigências para
aposentadoria compulsória contidas no § 1º, II.” (grifos nossos)
Por sua vez, EC 41/2003, através do seu art. 2º, criou uma regra
transitória de aposentadoria, que, uma vez preenchida, igualmente enseja a
percepção do abono de permanência, senão vejamos:
“Art.
2º Observado o disposto no art. 4º da Emenda Constitucional nº 20, de 15 de
dezembro de 1998, é assegurado o direito de opção pela aposentadoria voluntária
com proventos calculados de acordo com o art. 40, §§ 3º e 17, da Constituição
Federal, àquele que tenha ingressado regularmente em cargo efetivo na
Administração Pública direta, autárquica e fundacional, até a data de publicação
daquela Emenda, quando o servidor, cumulativamente:
I
- tiver cinqüenta e três anos de idade, se homem, e quarenta e oito anos de
idade, se mulher;
II
- tiver cinco anos de efetivo exercício no cargo em que se der a aposentadoria;
III
- contar tempo de contribuição igual, no mínimo, à soma de:
a)
trinta e cinco anos, se homem, e trinta anos, se mulher; e
b)
um período adicional de contribuição equivalente a vinte por cento do tempo que,
na data de publicação daquela Emenda, faltaria para atingir o limite de tempo
constante da alínea a deste inciso.
[...]
§ 5º O servidor de que trata este artigo, que tenha completado as
exigências para aposentadoria voluntária estabelecidas no caput, e que opte por
permanecer em atividade, fará jus a um abono de permanência equivalente ao valor
da sua contribuição previdenciária até completar as exigências para
aposentadoria compulsória contidas no art. 40, § 1º, II, da Constituição
Federal.” (grifos nossos)
Nesse
sentido, uma vez requerido, o abono de permanência deverá ser concedido ao
servidor público da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios que
preencherem os requisitos do art. 40, §1º, III, a, da CF/88 e optarem por
permanecer em atividade (art. 40, §19, CF/88).
Em outras palavras, tendo
escolhido continuar trabalhando, o servidor do sexo masculino que tenha
completado 35 anos de contribuição e 60 anos de idade ou, no caso do servidor do
sexo feminino, que tenha completado 30 anos de contribuição e 55 anos de idade,
e perfaça em qualquer caso dez anos de efetivo exercício no serviço público e
cinco anos no mesmo cargo efetivo, fará jus ao abono de permanência.
Outrossim, por força do art. 2º, §5º, da EC 41/2003, o servidor que tenha
ingressado no serviço público até 16/12/1998 (data de publicação da Emenda
Constitucional nº 20/1998), tendo alcançado 53 anos de idade e 35 anos de
contribuição somados ao pedágio, no caso de ser homem, ou 48 anos de idade e 30
anos de contribuição somados ao pedágio, no caso de ser mulher, contando em
qualquer caso com no mínimo 5 anos no mesmo cargo efetivo, optando permanecer na
ativa, fará jus ao abono de permanência.
O
art. 3º da EC 41/2003 ressalvou o direito adquirido à aposentadoria bem como à
percepção de pensão aos servidores públicos, bem como aos seus dependentes, que,
até a data de publicação desta Emenda (31/12/2003), tenham cumprido todos os
requisitos para obtenção desses benefícios, com base nos critérios da legislação
então vigente. Já o §1º deste artigo prevê a possibilidade de percepção do abono
de permanência, desde que esses servidores apresentem, no mínimo, 25 anos de
contribuição, se mulheres e 30 anos de contribuição, se homens.
A concessão do abono de permanência somente pode ser dar com relação às
regras do art. 40, §1º, III, a, CF/88 e dos arts. 2º e 3º da EC 41/2003. No que
tange aos servidores que preenchem os requisitos para aposentadoria sob a regra
do art. 3º da EC 47/05, a concessão do abono somente pode se concretizar após
aprovação do PEC nº 418/2009. Nesse sentido, até que se dê essa autorização
legal, a concessão do abono malfere o texto constitucional, pois constitui
liberalidade do gestor sobre o patrimônio público.
Notas
[1] Existe controvérsia doutrinária e jurisprudencial acerca da natureza
jurídica do abono de permanência. Alguns doutrinadores e tribunais entendem que
o abono possui natureza indenizatória, pois o Poder Público estaria indenizando
o servidor público que não exercitou o seu direito de aposentadoria. Outros, no
entanto, consideram que esse instituto possui natureza remuneratória. Existem
ainda os que compreendem o abono de permanência como uma espécie de prêmio.
[2] EC 20/1998 [...] Art. 3º - É assegurada a concessão de aposentadoria e
pensão, a qualquer tempo, aos servidores públicos e aos segurados do regime
geral de previdência social, bem como aos seus dependentes, que, até a data da
publicação desta Emenda, tenham cumprido os requisitos para a obtenção destes
benefícios, com base nos critérios da legislação então vigente.
§
1º - O servidor de que trata este artigo, que tenha completado as exigências
para aposentadoria integral e que opte por permanecer em atividade fará jus à
isenção da contribuição previdenciária até completar as exigências para
aposentadoria contidas no art. 40, § 1º, III, "a", da Constituição Federal.
(grifos nossos)
[...]
Art. 8º - Observado o disposto no art. 4º desta Emenda e ressalvado o
direito de opção a aposentadoria pelas normas por ela estabelecidas, é
assegurado o direito à aposentadoria voluntária com proventos calculados de
acordo com o art. 40, § 3º, da Constituição Federal, àquele que tenha ingressado
regularmente em cargo efetivo na Administração Pública, direta, autárquica e
fundacional, até a data de publicação desta Emenda, quando o servidor,
cumulativamente:
[...]
§ 5º - O servidor de que trata este artigo, que, após completar as
exigências para aposentadoria estabelecidas no ‘caput’, permanecer em atividade,
fará jus à isenção da contribuição previdenciária até completar as exigências
para aposentadoria contidas no art. 40, § 1º, III, ‘a’, da Constituição Federal.
(grifos nossos)
[3] EC 47/2005 – [...] Art. 3º Ressalvado o direito de opção à
aposentadoria pelas normas estabelecidas pelo art. 40 da Constituição Federal ou
pelas regras estabelecidas pelos arts. 2º e 6º da Emenda Constitucional nº 41,
de 2003, o servidor da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,
incluídas suas autarquias e fundações, que tenha ingressado no serviço público
até 16 de dezembro de 1998 poderá aposentar-se com proventos integrais, desde
que preencha, cumulativamente, as seguintes condições:
I - trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta anos de
contribuição, se mulher;
II
- vinte e cinco anos de efetivo exercício no serviço público, quinze anos de
carreira e cinco anos no cargo em que se der a aposentadoria;
III
- idade mínima resultante da redução, relativamente aos limites do art. 40, §
1º, inciso III, alínea "a", da Constituição Federal, de um ano de idade para
cada ano de contribuição que exceder a condição prevista no inciso I do caput
deste artigo.
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